Longe de ser mera
repetição, o assunto deste último evangelho é tão distinto quanto os três
primeiros. No evangelho de João, o Senhor Jesus é apresentado como o Filho de
Deus (Jo 1:34). É Deus revelado como luz e amor. João põe diante de nós a glória
divina de Sua Pessoa, por causa de quem Ele é – o “Eu sou” (Jo 8:58).
Há muitas marcas que
distinguem o evangelho de João. Enquanto os três evangelhos anteriores são
sinóticos[1] – dando
um esboço da vida do Senhor – não encontramos isso em João. Em vez disso, “n’Ele
estava a vida; e a vida era a luz dos homens” (Jo 1:4). Neste evangelho não
temos genealogia, nem registro de Seu nascimento, encontrando em vez disso o
que Ele era no início, antes da criação – o Filho Eterno. Ele era Deus antes de
Se tornar Homem.
Como Filho de Deus, não
lemos a agonia no jardim; em vez disso, vemos Sua Majestade divina desconcertando
Seus inimigos (Jo 18:6). Não há parábolas, e apenas um milagre em comum com os
outros evangelhos (Jo 6:5-14). Há um número de palavras peculiares ao evangelho
de João, não que elas não ocorram em outro lugar, mas em nenhum lugar com tal
regularidade. Quatro deles – “amor”, “mundo”, “crer” e “vida”
– são encontrados juntos em João 3:16. Em vinte e cinco ocasiões, o Senhor
introduz Suas palavras com “em verdade, em verdade”, acentuando a sua
importância.
A rejeição de Cristo
por Israel é assumida a partir do início: “Veio para o que era Seu, e os Seus
não O receberam” (Jo 1:11). No que diz respeito ao judaísmo é dito “dos
judeus” (como nos caps. 2:6, 2:13 e 5:1) – uma frase que ocorre com pouca
frequência nos outros evangelhos, mas muitas vezes no de João. João Batista
identifica o Senhor, não como o Messias, mas como “o Cordeiro de Deus, que
tira o pecado do mundo” (Jo 1:29). Causa maravilha, não o testemunho
público de João, mas a expressão do seu coração – “Eis o Cordeiro de Deus!”
(Jo 1:36) – que faz com que seus discípulos O sigam. João os reúne ao Senhor;
Jesus os reúne para Si mesmo – “segue-Me” (Jo 1:43). Quando Natanael reconhece
o Senhor como o Filho de Deus, o Rei de Israel – um quadro para nós do
remanescente judeu – o Senhor introduz imediatamente o “Filho do Homem”, um título que nos leva para além de Israel, leva
para Seu direito de liderança universal (Jo 1:51).
O capítulo 2 nos apresenta
a Sua glória milenar. O gozo desse reino é prefigurado na cena do casamento em
Caná (Jo 2:11), enquanto na purificação do templo temos o juízo que o
caracterizará (Jo 2:14-17).
No capítulo 3, encontramos
que o único caminho para o reino de Deus é por meio do novo nascimento (Jo
3:3). A carne, não importa quão religiosa seja, não pode entrar no reino;
deve ser julgada e aqu’Ele que é vida deve morrer. Não há nada no homem que
agrade a Deus: “O que é nascido da carne é carne, e o que é nascido do Espírito
é espírito” (Jo 3:6). Deus não pode confiar no homem (Jo 2:24); em vez
disso, o homem deve colocar sua confiança em Deus (Jo 3:36). Os três primeiros
capítulos são introdutórios ao livro inteiro.
Indo adiante deles,
eles O seguem (Jo 10:4). Ele é o nosso tudo:
- “Eu
Sou o pão da vida” (cap. 6:35);
- “Eu
Sou a luz do mundo” (cap. 8:12);
- “Eu
Sou a porta” (cap. 10:9);
- “Eu
Sou o bom Pastor” (cap. 10:11, 14);
- “Eu
Sou a ressurreição e a vida” (cap. 11:25);
- “Eu
Sou o caminho, a verdade e a vida” (cap. 14:6);
- “Eu Sou a videira verdadeira” (cap. 15:1).
Se o Senhor reúne, ele
também divide por causa de Sua Pessoa (Jo 7:43), por causa de Suas obras (Jo
9:16) e por causa de Suas Palavras (Jo 10:19). No capítulo 9, o Senhor Jesus e
aqueles que creem n’Ele são rejeitados e expulsos (Jo 9:34). No capítulo 10, Ele
chama os que são Seus pelo nome e os leva para fora do aprisco (judaísmo), para
que haja um rebanho (a Igreja) e um Pastor (João 10:3, 16). No capítulo 11
temos a profecia de que Ele morreria, não apenas para Israel, “mas também
para reunir em um corpo os
filhos de Deus, que andavam dispersos” (Jo 11:52).
No capítulo 12, Jesus
responde ao povo, “e Eu, quando for levantado da Terra, todos atrairei a Mim”
(Jo 12:32). Como Ele é celestial, o Seu povo também será. Ele não nos conduz a
uma terra prometida aqui nesta cena terrena, a cena de Sua rejeição, mas à casa
de Seu Pai: “Na casa de Meu Pai há muitas moradas; se não fosse assim, Eu vo-lo
teria dito: vou preparar-vos lugar. E, se Eu for, e vos preparar lugar, virei
outra vez e vos levarei para Mim mesmo, para que onde Eu estiver estejais vós
também” (Jo 14:2-3). Nem ficamos sem consolo, pois o Espírito Santo é
prometido no momento da Sua saída deste mundo (Jo 14:16; 16:7). Finalmente, no
capítulo 17, ouvimos o Senhor em comunhão com o Pai, “para que todos sejam
um, como Tu, ó Pai, o és em Mim, e Eu, em Ti; que também eles sejam um em Nós,
para que o mundo creia que Tu Me enviaste” (Jo 17:21).
Nos capítulos 18 a 21,
temos o julgamento, a morte e a ressurreição do Senhor. “Está consumado” (Jo
19:30); assim, o trabalho do Filho está completo. Aparecendo a Maria, Ele pode
dizer-lhe “vai para Meus irmãos, e dize-lhes que Eu subo para Meu Pai e
vosso Pai, Meu Deus e vosso Deus” (Jo 20:17). A exortação conclusiva do Senhor
a Pedro é, “segue-Me tu” (Jo 21:22).
[1]
N. do T.: Evangelhos sinópticos ou evangelhos sinóticos é um
termo que designa os evangelhos de Mateus, Marcos, Lucas por conterem uma
grande quantidade de histórias em comum, na mesma sequência, e algumas vezes
utilizando exatamente a mesma estrutura de palavras.
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